Ecopoesia

Tronco

José Emilio Pacheco

Discos de lenha para o calor desta noite.

Um pedaço de tronco enorme.

A julgar pelos círculos teria

pelo menos trezentos anos

quando o derrubaram.

 

Agora ele e eu, nós dois sozinhos,

compartilhamos a noite gelada e obscura.

A escuridão indizível sugere:

“Esta será a última noite na terra.”

 

Essa árvore morreu para que eu sobreviva

à xenofobia

do frio em terra estranha

(em ambos sentidos).

Entre sombras que dançam lá fora

e passos de algo ou alguém em redor

da cabana no mais profundo norte.

 

Queima bem o tronco feito lenha

e eu fico observando o fogo.

Penso na árvore viva há cem anos.

Me esperava (e eu ainda não nascia)

para esta noite de fim e de encontro.

 

Nasceu, cresceu e morreu com o único objetivo

de me dar luz, calor e fogo esta noite.

Mas daqui a algumas horas

eu, o ingrato, partirei daqui.

Não há remédio.

 

Outro está a caminho deste bosque.

Para chegar à cabana, ainda precisa

contornar o círculo de um século.

 

Pacheco, José Emilio. "Tronco." Tarde o temprano: poemas 1958-2009. 1 ed. Barcelona: Tusquets Editores, 2010. pp. 557-58

Primera edición en: Pacheco, José Emilio. La arena errante: poemas, 1992-1998. México: Ediciones Era, 1999.

Tradução para o português: Elys Regina Zils



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