Ecopoesia

Parentesco

Astrid Cabral

Antes só conhecia o tucunaré

da banca do mercado, ensangüentado

ou saltitante no bojo da canoa

abicando na praia do rio Negro.

Tucunaré para mim era manjar

aroma na terrina me fisgando

sem demora impelindo-me a comer

sem pensar em escamas ou espinhas.

Só via a pinta rubra bem redonda

ali perto do rabo, o talhe longo

e o gostosíssimo sabor na boca.

Quedei-me, pois, perplexa, genuflexa

com a história de seu universo

naquela reportagem da telinha.

Passei a sentir-me sua parenta

vendo o tucunaré super-humano

a proteger os alevinos tecendo

com amorosos cuidados um escudo

contra os perigos do rio a rondarem

os inocentes peixinhos, em vez

de largá-los ao deus-dará das águas.

 

 

 

Cabral, Astrid. "Parentesco." Cage. Austin: Host Publications, 2008. p. 28.




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