Ecopoesia

A primeira Terra - Primeira parte

Josely Vianna Baptista

1

 

O verdadeiro Pai Ñamandu, o primeiro,

seu leito na Terra para si mesmo concebendo,

com o saber contido em seu ser-de-céu,

e sob o sol de seu lume criador,

fez com que da ponta de seu cetro

fosse surgindo a Terra.

 

2

 

Uma palmeira azul criou no futuro centro da Terra;

outra na morada de Karaí;

uma palmeira azul na morada de Tupã;

na fonte dos bons sopros da Terra, uma palmeira azul;

criou cinco palmeiras azuis:

a morada na Terra está atada a essas palmeiras eternas.

 

3

 

Existem sete céus;

o céu se assenta sobre esteios:

seus esteios são cetros.

O céu que se estende com os ventos

Nosso Pai empurrou, mandou embora.

 

4

 

Primeiro colocou três esteios no céu,

e o céu ainda oscilava.

Por isso,

fincou-lhe quatro esteios-cetros,

e ele ficou no lugar certo,

sem se mover.

 

5

 

Quem primeiro sujou o leito terreno

foi a serpente do começo;

agora em nossa Terra só resta seu reflexo:

a verdadeira vive fora

do céu de Nosso Pai.

 

6

 

No leitor terreno de Nosso Pai

o primeiro canto,

o primeiro lamento,

foi da yrypa, a pequena cigarra vermelha.

 

7

 

A cigarra vermelha do começo

está fora do céu de Nosso Pai:

agora em nossa Terra

só sua sombra resta.

 

8

 

O yamai

por muito tempo fez as águas.

O que mora hoje em nossa Terra

não é mais o verdadeiro,

o verdadeiro está fora do céu de Nosso Pai:

agora em nossa Terra

só resta seu reflexo.

 

9

 

Quando Nosso Pai fez a Terra,

tudo era mata:

não existiam campos.

Por isso,

para que fosse elaborando prados

fez vir o tucura.

No lugar em que o tucura fincou

as patas traseiras

foram brotando brenhas de biurás

e só então despontaram os prados.

E no campo tiniram,

tilintaram os sons do tucura

comemorando.

O tucura originário

está fora do céu de Nosso Pai:

só sobrou sua sombra.

 

10

 

Quando o sol iluminou o prado,

os primeiros sons que se ouviram,

quem primeiro se alegrou

foi o inhambu vermelho.

O imambu vermelho

— seu pio o primitivo som no prado —

agora está fora do céu de Nosso Pai:

hoje no leito terreno

só resta seu reflexo.

 

11

 

Quem primeiro feriu a Terra na morada de Nosso Pai

foi o tatu.

Não é mais o tatu verdadeiro

que existe agora em nossa Terra:

esse não passa de um espectro.

 

12

 

O nome do escuro é o murucutu.

E nosso Pai, o Sol, lume da aurora.

 

 

 

Baptista, Josely Vianna. “A primeira Terra – Primeira parte”. Roça barroca. São Paulo: Cosac Naify, 2011. pp. 43-49.




Comment Box is loading comments...